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Turismo, instrumento de conservação ambiental e cultural

Pesquisa de iniciação científica no Museu Goeldi sob orientação da Dra. Cristina Senna prova que o turismo pode ser utilizado a favor da conservação do meio ambiental, assim como da longevidade de manifestações culturais
publicado: 08/07/2013 13h45, última modificação: 14/08/2017 10h53

Agência Museu Goeldi – A exemplo de tantas regiões mundo afora, o Nordeste paraense, na Costa Atlântica da região Norte do Brasil, apresenta uma riqueza cultural marcante, combinada a uma natureza física de beleza irrefutável. Festas populares como a da Gó (peixe muito apreciado na região), do Caranguejo e da Marujada são alguns dos exemplos mais óbvios de manifestações culturais já tradicionais do município paraense de Quatipuru, na costa do Pará. 

As festas são realizadas graças aos recursos oferecidos pela natureza. A gó é produto da pesca realizada tradicionalmente pelos quatipurenses; o caranguejo é tirado do mangue, ecossistema característico da região; e a Marujada, resultante do sincretismo entre cristianismo e umbanda, é embalada por instrumentos feitos do couro de animais silvestres, como tambores e cuícas. Porém, essas tradições correriam sério risco de desaparecer, junto com o patrimônio natural, caso houvesse uma intensificação da degradação ambiental, revela pesquisa Pibic orientada pela geóloga do Museu Paraense Emílio Goeldi, Dra. Cristina Senna. 

“O turismo como promotor da conservação ambiental nos ecossistemas da planície costeira do município de Quatipuru – Pará” é o estudo desenvolvido pela bolsista Stephanie Holanda sob orientação da geóloga. A iniciativa trabalha principalmente a desmistificação de uma atividade conhecida como prejudicial ao patrimônio natural, histórico, arquitetônico e até mesmo imaterial. “Temos que desmistificar a ideia de que o turismo é um segmento danoso ou degradante”, afirma a bolsista, “pois, para trabalhá-lo, deve ser elaborado um planejamento coeso e eficaz, partindo de informações locais, de cunho ambiental, social e econômico”. Em outra edição do Destaque Amazônia, matéria sobre Turismo em Terras Indígenas também aborda a necessidade de se estabelecer um planejamento condizente com a realidade das comunidades envolvidas na atividade*.

Planejamento e participação - A valorização desse conhecimento tradicional elevaria, segundo as pesquisas do Museu Goeldi, a auto-estima dos moradores de Quatipuru, que passariam a zelar cada vez mais pelos recursos naturais para garantir a longevidade das tradições culturais que compõem a identidade deles. Um trabalho de valorização cultural aliado à educação ambiental que propõe o ecoturismo e o geoturismo, ramos turísticos assentados sobre os conceitos de natureza e sustentabilidade, como ferramentas de conservação ambiental. 

Mas, para isso, é preciso haver o engajamento da prefeitura municipal, principalmente no que se refere à oferta de uma boa infraestrutura turística para acolher pessoas dos quatro cantos do mundo interessadas em conferir os guarás e os exuberantes bosques de mangue, capazes de alcançar os 30 metros de altura. “Esses elementos naturais são considerados belezas cênicas com potencialidade paisagística para a atração do turista”, afirma Stephanie. Segundo ela, Quatipuru dispõe, atualmente, de hotéis e restaurantes considerados de pequeno porte e que não podem acolher um grande contingente de turistas. 

Roteiros de passeio – Além dos bosques de mangue, Quatipuru apresenta açaizeiros e buritis da várzea, os quais, em conjunto com as capoeiras formadas a partir da agricultura de subsistência, formam paisagens com grande potencial para atrair turistas. Até mesmo o pisoteio do búfalo, responsável pela diminuição da impermeabilidade do solo, segundo os dados levantados pelo colega de Stephanie, Adalberto Silva, forma espelhos d´água, também alimentados pelas cheias e pela subida e descida das marés, capazes de agradar os olhos de pessoas com os mais diversos perfis. 

A abordagem de paisagem feita pela futura bacharel em turismo também não descarta as pessoas enquanto agentes transformados pelo ecossistema na mesma medida em que o transformam. O rio é outro recurso utilizado no sustento do ribeirinho e integra paisagem cuja beleza cênica é intensificada pela ação humana, que deixa suas marcas como os currais de pesca e as canoas paradas defronte a pequenos caminhos d'água. Quadros que se constituem aos olhos em autênticas pinturas marinhas, tema tão presente nas Belas Artes.

“Esses roteiros poderiam ser compostos de passeios de barcos ao longo do estuário do Rio Quatipuru, para observação da fauna e da flora e também da atividade ribeirinha”, propõe a bolsista a partir dos estudos empreendidos na cidade, incrementados com depoimentos de representantes da Secretaria de Desporto, Cultura e Turismo, responsável pelas ações ambientais no município, e com professor da rede municipal de ensino que planejava, à ocasião, realizar um roteiro ecociclístico.

Pesquisa em várias escalas - Stephanie de Holanda inventariou as potencialidades turísticas naturais do município de Quatipuru a partir dos mapeamentos das paisagens da área feitos por Adalberto Silva e por João Silva Barbosa Junior, na pesquisa Ecologia de Paisagem, Sensoriamento Remoto e Geoprocessamento Aplicados à Análise Ambiental da Planície Costeira do Município de Quatipuru, Pará, também orientada pela Dra. Cristina Senna dentro do projeto “Proxies Biológicos e biogeoquímicos para interpretação das variações climáticas holocênicas de curto e longo período na região costeira amazônica”, no Museu Goeldi. Para Stephanie, as pessoas atribuem a cada ambiente de Quatipuru, os quais compõem um complexo mosaico paisagístico, uma função específica. Conclusão semelhante à alcançada por Adalberto.

Os trabalhos de João, Stephanie e Adalberto estão vinculados a estudo mais amplo desenvolvido no Museu Paraense Emílio Goeldi pela Dra. Cristina Senna. Geóloga da instituição, a pesquisadora se dedica à dinâmica ambiental desses ambientes costeiros durante o holoceno, era geológica de dez mil anos atrás, a partir das análises de sedimentos e de pólen. Além das informações reveladas nas pesquisas dos bolsistas Pibic, a pesquisa ambiental da Dra. Cristina é multidisciplinar e dialoga com os estudos desenvolvidos noutras áreas do Museu, como os esforços antropológicos empreendidos pela Dra. Lourdes Furtado, da Coordenação de Ciências Humanas, no projeto “Recursos Naturais e Antropologia das Sociedades Marítimas, Ribeirinhas e Estuarinas da Amazônia: Relação do Homem com o seu Meio Ambiente” (Renas).

*Confira na edição de Novembro de 2012 do jornal Destaque Amazônia
http://www.museu-goeldi.br/sobre/NOTICIAS/destaque/2012/novembro2012.html

 

 

Texto: Antônio Fausto